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Descompressão no Lado Francês

Castelo Chillon no Lago Leman em Montreaux

Pôr do Sol no Lago Leman

Quando tivemos a oportunidade de nos mudarmos para a Suíça eu tinha, sim, o meu lado preferido desse país: a parte francófona (a Suisse Romande). Certamente, porque lá estariam as organizações internacionais e universidades vinculadas à minha área de pesquisa, também por causa da língua, já que eu havia estudado francês em várias outras oportunidades. Mas, por conta desses tantos planos “B” da vida, eu vim parar em Lilliput, no lado alemão da Suíça (a Deutsche Schweiz), onde o choque das civilizações me pareceu ainda mais robusto do que eu poderia supor. E, no alto da minha teimosia, eu preferi continuar estudando francês, e fazendo do meu mundinho particular, na verdade, um universo inteiramente paralelo.

O resultado é que, às vezes – como eu me sinto uma esfera vivendo numa caixa quadrada, onde minhas pernas e alma não se amoldam, e eu não faço tanta questão de caber também – eu preciso passar por um processo de descompressão, ou seja, eu preciso ter a sensação que as rédeas sociais estão mais frouxas, onde eu não tenho que pedir para que as crianças façam silêncio na rua ou não exprimam seus sentimentos de alegria em público; ou onde eu possa deixar meu cabelo solto com grandes brincos marulhando no vento; ou possa usar um brilho na minha blusa e olhar ao lado e ver gente fashion e criativa me circundando. É algo como folgar o espírito, desarticular a racionalidade, e simplesmente ser, ver e sentir como eu mesma, sem me preocupar se alguém da “firma” do Didier Pai vai passar pela outro lado da calçada pronto para me julgar.

Chateau de Gruyère

Foi em busca desse espírito desarraigado que passamos o primeiro final de semana de setembro/2018 entre Gruyères, Montreux e Chillon. Nem o sábado de chuva e neblina foi capaz de esconder o charme da medieval Gruyères com seu castelo no topo da colina. Aliás, o castelo foi uma grata surpresa: pequenino, mas com uma curadoria genial! Num dos salões haviam inúmeros quadros de diferentes artistas retratando suas percepções em relação àquele castelo. Enfim, uma forma mais arrojada de se pensar e de se refletir sobre um patrimônio histórico.

Quadro no Chateau de Gruyère

Também foi digno de nota, no quesito descompressão, o passeio pela fábrica de chocolate da Maison Cailler. Eu fiquei admirada com a ousadia da contação da história do chocolate: colocaram o conquistador espanhol e a Igreja Católica, na época da descoberta da América, como eles realmente eram e pensavam. No mínimo, foi fabuloso ver uma história ser contada com responsabilidade e respeito às futuras gerações.

O ponto questionável na história da fábrica, porém, é a manutenção de um tipo de chocolate (criado em 1907) até os dias atuais que, sob o meu ponto de vista, continua a validar a compreensão do estereótipo feminino como o sexo frágil, meigo, delicado, voluptuoso, sensível e blá blá blá. Respeito à memória é uma coisa, mas continuísmo retrô e misógeno me soa bastante incompreensível no mundo atual.

E tenho também comigo um grande ponto de interrogação: como será a cultura e a ligação da empresa em relação aos direitos humanos? À julgar pelas fotos das fazendas de cacau na Côte d’Ivory e seus trabalhadores rurais e suas falas, que estampavam as paredes de um dos salões, bem que caberia uma ênfase maior na conformidade e adequação às normas internacionais de business and human rights.

E, por último, para realmente suavizar o freio: os passeios pela promenade, em Montreux, para apreciar o azul do Lac Léman; a desenvoltura cool dos artistas com seus trabalhos em caricaturas, em esculturas, em bolhas de sabão, em pockets shows de jazz e de reggae. Tudo, ali ao mesmo tempo: num frescor entre liberdade e calmaria. Tudo, ali sob os olhares da estátua de Freddie Mercury nos dizendo: “I want to break free”.

Depois, devidamente descomprimida e renovada, na hora de voltar para casa, por todo o trajeto até Lilliput, era como se “The Show Must Go On” pulsasse infinitamente na minha alma.

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